sábado, 30 de junho de 2012

Rito Escocês Antigo e Aceito na França


Um amigo meu me garantiu que o Rito Escocês não está subordinado ao Grande Oriente de França. Pelo contrário: o Soberano Grande Commendador Jean Guillaume Viernet resistiu ao Grão-Mestre Magnan (o marechal do exército francês que não era Maçom e foi imposto por Napoleão III para pacificar a Maçonaria francesa) e jamais se submeteu. O Supremo Conselho de França, Corpo autônomo e independente, só abriu mão dos três primeiros Graus quando essa separação ficou definida por influência do Supremo Conselho de Charleston”. Isso está correto?

Não. Seu amigo está confundindo coisas diferentes. Vamos por partes. Primeiro, não existe, como organização, “o Rito Escocês”. O que existem são Supremos Conselhos, organizações que controlam a prática do Rito.

Na França existem, pelo menos, TRÊS Supremos Conselhos do Rito Escocês Antigo e Aceito que são importantes, têm peso e são considerados legítimos pelos franceses.  É sempre fundamental sabermos de qual deles estamos falando e não misturar um com o outro.

Vamos explicar resumidamente:  

1.  Em outubro de 1804, após a fundação do primeiro Supremo Conselho do REAA em 1801 em Chaleston, o Conde de Grasse-Tilly retornou a França e fundou, em Paris, o segundo Supremo Conselho do REAA no mundo.

2. A partir de 1805 (aindo no governo de Napoleão I), o Grande Oriente de França se apoderou do controle do Supremo Conselho do REAA (tratado de dezembro de 1804). 

3. Em 1815, o Supremo Conselho do REAA subordinado ao Grande Oriente de França passa a se chamar “Suprême Conseil Grand Collège du Rite Écossais Ancien Accepté”.

4. Em 1821, é fundado um outro Supremo Conselho do REAA, o “Suprême Conseil de France”, potência maçônica independente e soberana, controlando do grau 1 ao 33, e criando por conta própria lojas simbólicas. Esse Supremo Conselho se considera (por algumas razões) também como uma continuação do Supremo Conselho original fundado em Paris pelo Conde Grasse-Tilly em 1804. Foi esse Supremo Conselho, que o  Grande Oriente de França, sob o comando do Grão-Mestre Marechal Magnan, tentou absorver, durante o governo de Napoleão III. O Soberano Grande Commendador DESSE Supremo Conselho era, na época, Jean Guillaume Viernet.

5. Embora em 1897, o “Suprême Conseil de France” tenha criado uma Grande Loja (“Grande Loge de France”) e tenha em 1904 delegado a essa Grande Loja a emissão de cartas constitutivas de Lojas, permanece até hoje com o “Suprême Conseil de France” o controle de todos os seus graus (de 1 a 33).  

6. Em 1964, há um cisma no “Suprême Conseil de France”, e o Soberano Grande Comendador Charles Riandey, junto com outro 400 irmãos se retiram. Acreditavam, erroneamente, que com isso o “Suprême Conseil de France” deixaria de existir.

7. Em 1965, contando com o apoio do Supremo Conselho da Jurisdição Sul dos Estados Unidos, Charles Riandey e os dissidentes fundaram um Supremo Conselho do REAA, nos moldes americanos, chamado “Suprême Conseil pour la France” que é o único reconhecido pelo Supremo Conselho da Jurisdição Sul dos Estados Unidos. O “Suprême Conseil pour la France” trabalha junto com a “Grande Loge nationale française

Portanto, é verdade que:

A. O Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito do Grande Oriente de França (“Suprême Conseil Grand Collège du Rite Écossais Ancien Accepté”) está subordinado ao Grande Oriente França, através do Colégio de Ritos.

B. Há um outro Supremo Conselho do REAA, o Suprême Conseil de France” que resistiu bravamente a tentativa de ser incorporado ao Grande Oriente. Mas, que não abriu mão de grau nenhum e nem é reconhecido pelo Supremo Conselho da Jurisdição Sul dos Estados Unidos.

C. Há um terceiro Supremo Conselho do REAA, o “Suprême Conseil pour la France”, fundado em 1965 e que é o reconhecido pelo Supremo Conselho da Jurisdição Sul dos Estados Unidos. 

Você pode ler um bom resumo da História do REAA na França em:

Ou pode consultar também diretamente os sites:

A. Suprême Conseil Grand Collège du Rite Écossais Ancien Accepté

B. Suprême Conseil de France

C. Suprême Conseil pour la France

O avental do Arco Real inglês

Já ouvi dizer, no Real Arco americano, que o avental do Arco Real inglês tem uma orla dentada azul (do simbolismo) e vermelho (dos altos graus) justamente para indicar que o Arco Real inglês continua sendo parte dos Graus Simbólicos.  Isso é verdade?

Isso não tem nenhum fundamento. Embora o uso de certas cores na Maçonaria apareçam em diversos ritos, países e sistemas maçônicos, elas não são usadas da mesma forma e muitas vezes sequer simbolizam a mesma coisa.

O azul é cor do simbolismo nos Estados Unidos e o vermelho é a cor dos graus capítulares do Real Arco americano, assim como o negro é a cor dos graus de Cavalaria americana. Nos Estados Unidos, cada cor substitui a anterior.

O uso das cores na Maçonaria britânica (inglesa, escocesa e irlandesa) é semelhante, porém diferente. O azul é a cor por excelência da Maçonaria como um todo e em especial do simbolismo  e o vermelho é a cor do Arco Real, porém o vermelho é usado em adição ao azul. Há aventais na Irlanda com borda azul, vermelha e negra para indicar que seu portador era Mestre Maçom, Mestre do Arco Real e Cavaleiro Templário.

Reforçamos o ponto: é um erro querer interpretar o uso das cores de um sistema maçônico (inglês, por exemplo) pelos critérios de uso que essas cores têm em outro sistema (americano, por exemplo).

Vale também observar que as divergências na forma de usar as cores e nos seus  significados são maiores ainda quando consideramos outros países e ritos. Por exemplo, o vermelho é utilizado no simbolismo: o avental de Mestre (grau 3) da COMAB aqui no Brasil é vermelho, e nossos irmãos do Rito Brasileiro, já usam uma gravada vermelha (bordeaux) desde do grau 1.

Por fim, vale relembrar que, SE o Arco Real inglês fosse realmente parte dos Graus Simbólicos, ele estaria mais próximo ainda do antigo Arco Real como era praticado na Grande Loja dos Antigos. Lá, o Arco Real realmente era parte dos Graus Simbólicos.

sábado, 2 de junho de 2012

Esclarecendo “Real Arco & Arco Real”

Li num certo artigo entitulado “Real Arco & Arco Real” que a Grande Loja de Londres e Westminster (Os Modernos) não aceitava “nem a pau” (como diz aquele artigo) o Arco Real enquanto que Grande Loja dos Antigos o praticava e que a solução, na fusão das duas Grandes Lojas em 1813, foi transformar o Arco Real em um grau lateral. Foi isso realmente o que aconteceu?

Não. Não foi isso o que ocorreu.  Primeiro observe que a primeira ata do primeiro Grande Capítulo do Arco Real ligado a Grande Loja de Londres e Westminster é datada de 22 de março de 1765, e que em 11 de junho de 1766, o Grande Capítulo exaltou o Grão-Mestre da Grande Loja de Londres e Westminster (a primeira Grande Loja), o qual se tornou imediatamente Grande Principal do Grande Capítulo. Portanto “Os Modernos” já praticavam o Arco Real bem antes da fusão em 1813.

Você pode ler um pouco da História do primeiro Grande Capítulo em:

A divergência entre a Grande Loja de Londres e  Westminster e a Grande Loja dos Antigos NÃO era sobre aceitar ou não o Arco Real.  A divergência relativa ao Arco Real era que a Grande Loja de Londres e  Westminster via esse grau como um grau adicional, separado da Maçonaria Simbólica, enquanto que a Grande Loja dos Antigos o via literalmente como parte integrante da Maçonaria Simbólica, em particular como parte do terceiro grau.

Você mesmo pode conferir a visão da Grande Loja dos Antigos sobre o Arco Real em:

e também na Enciclopédia de Mackey, verbete “York Rite”, na página 1036,  em:

Vale também notar que Dr. Mackey apresenta um argumento interessante de que mesmo antes da fundação do primeiro Grande Capitulo do Arco Real, em 1765, a Grande Loja de Londres e Westminster (chamada também de “the legal, or constitutional, Grand Lodge”) já praticava o conteúdo  Arco Real, porém com parte integrante do terceiro grau. 

Veja Enciclopédia de Mackey, verbete “Royal Arch Degree”, páginas 757 a 760, em:


Mas por que o início do segundo artigo do Tratado de União, em 1813, entre as duas Grandes Lojas rivais inglesas é “A antiga pura Maçonaria consiste de três graus e somente três, isto é, Aprendiz, Companheiro e Mestre, incluindo o Sagrado Arco Real [...].”? Como entender que 3 são 4?
   
Recapitulemos, de um lado temos a Grande Loja de Londres e Westminster (os Modernos) que praticava, pelo menos desde 1765, o grau do Arco Real como um grau adicional, separado da Maçonaria Simbólica; do outro lado temos a Grande Loja dos Antigos que praticava o Arco Real como parte integrante da Maçonaria Simbólica, em particular como parte do terceiro grau.

A frase no início do segundo artigo do Tratado de União de 1813 extremamente inteligente porque pode ser lida de duas maneiras diferentes. Quem era da Loja de Londres e Westminster (os Modernos) leria que a “antiga e pura Maçonaria” era feita de três graus e mais o grau do Arco Real, o que coincidia com a visão dos “Modernos”. Por outro lado, quem era da Grande Loja dos Antigos leria que Arco Real estava incluindo no grau de Mestre, o que coincidia com a visão dos Antigos. 


A Grande Loja dos Antigos tinha também um Grande Capítulo do Arco Real?

Sim, mas como a Grande Loja dos Antigos via o Arco Real como parte da Maçonaria Simbólica,  esse Grande “Capítulo” do Arco Real da Grande Loja dos Antigos nada mais era do um Comitê, uma Comissão, dentro da Grande Loja dos Antigos.

Você pode ler isso e mais detalhes sobre isso em:


Li, naquele mesmo artigo entitulado “Real Arco & Arco Real”, que após a fusão das Grandes Lojas, o Grande Capítulo do Arco Real foi colocado subordinado a Grande Loja Unida, por haver suspeita e medo do que veio de fora da Inglaterra e para melhor controlá-lo. É verdade?  

Essa afirmativa não tem sentido, por pelo menos dois motivos:

  1. Nas duas Grandes Lojas (dos Modernos e dos Antigos), os Grandes Capítulos do Arco Real já eram subordinados às respectivas Grandes Lojas.

  1. Na Escócia, quando os Capítulos do Arco Real se organizaram, eles também buscaram se colocar “sob a asa” da Grande Loja da Escócia, porém essa Grande Loja não aceitou. 

Você pode ler isso e mais detalhes na seção de História (History) do site do próprio Supremo Grande Capítulo do Arco Real da Escócia :

Além disso, como podemos ler no site do Grande Capítulo do Distrito de North Munster do Arco Real da Irlanda:

‘However, Royal Arch workings have been an integral part of Craft Masonry since “Time Immemorial” and before 1830, it was the Irish Tradition to work Higher Degrees under the sole authority of a Craft Warrant.’

ou seja

‘No entanto, a ritualística de Arco Real foi uma parte integrante da Maçonaria Simbólica desde “tempos imemoriáveis” e antes de 1830, foi a Tradição Irlandesa trabalhar os graus superiores sob a autoridade apenas de uma Carta Constitutiva [Warrant]  do Simbolismo.’

Veja, por você mesmo, em:


Ainda naquele artigo entitulado “Real Arco & Arco Real”, encontramos que “É preciso entender que o Arco Real inglês continua parte dos Graus Simbólicos, tal como determinado pelos artigos da União de 1813.” Isso é verdade, o Arco Real inglês é parte dos graus simbólicos?

Não. Aqui está se confundindo dois conceitos diferentes: O Grande Capítulo do Arco Real Inglês é subordinado a Grande Loja Unida da Inglaterra, mas isso não significa que o Arco Real inglês seja parte dos graus simbólicos. São dois conceitos distintos. Por exemplo, o Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito do Grande Oriente de França (Suprême Conseil Grand Collège du Rite Écossais Ancien Accepté) está subordinado ao Grande Oriente França, através do Colégio de Ritos, mas isso não quer dizer que os 30 graus (de 4 ao 33) do Rito Escocês Antigo e Aceito no Grande Oriente  de  França tenham se tornado parte dos graus simbólicos.

Vale ainda notar que a visão de que o Arco Real é parte integrante dos graus simbólicos é exatamente a visão da Grande Loja  dos Antigos. Visão essa que acabou não prevalecendo. Note também que a versão do Arco Real que mais se afastou do Arco Real como entendido e praticado na Grande Loja dos Antigos foi justamente o Real Arco americano, o qual não só propôs uma total independência do Real Arco em relação a Maçonaria Simbólica como criou graus totalmente novos, americanos, como por exemplo, Mui Excelente Mestre.  


De onde vem a noção de que as Potências Filosóficas tem que ser independentes das Potências Simbólicas?

Essa noção vem dos Estados Unidos. Ela surgiu no final do século XVIII e começo do século XIX, quando as primeiras Potências Filosóficas (Supremo Grande Capítulo do Real Arco, Grande Acampamento da Cavalaria e Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito) se organizaram nos Estados Unidos.  A Maçonaria Simbólica lá estava dividida em dezenas de Grandes Lojas Estaduais, todas independentes entre si e nem todas se reconhecendo mutuamente. Isso tornava simplesmente impossível buscar qualquer vínculo das Potências de Maçonaria Filosófica (graus além do terceiro grau) com a Maçonaria Simbólica.

Até o final do século XX, ainda havia problemas de reconhecimento mútuo entre as Grandes Lojas Estaduais americanas. Até hoje, a Maçonaria Simbólica nos Estados Unidos é dividida em 51 Grandes Lojas Estaduais (50 Estados e um Distrito federal), todas independentes entre si, apesar dos acordos de mútuo reconhecimento que hoje existem.